1. Introdução
A “Técnica da Sala de Controle” é uma intervenção psicológica baseada nos princípios da Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) e, mais especificamente, na Terapia do Esquema, desenvolvida por Jeffrey Young. Um dos manejos clínicos da Terapia do Esquema é o trabalho com os modos esquemáticos, os quais costumo chamar de “vozes modais”.
Desenvolvi a atividade da Sala de Controle durante o manejo de um caso clínico particularmente desafiador. A ideia foi propor um exercício imaginativo que facilitasse o reconhecimento e a autorregulação dos estados emocionais internos através de uma metáfora acessível para o paciente atendido. O objetivo central era possibilitar ao paciente maior consciência sobre seus modos esquemáticos ativados e fortalecer o papel do Modo Adulto Saudável como um gestor interno das emoções e comportamentos.
2. Fundamentação Teórica
A Terapia do Esquema entende que experiências precoces moldam padrões de funcionamento mental duradouros, conhecidos como Esquemas Desadaptativos Remotos e, em situações de estresse, esses esquemas podem ser ativados através de diferentes “modos”, que representam estados emocionais e comportamentais momentâneos. Young define os modos esquemáticos como “um conjunto de esquemas ou operações de esquema, adaptatives ou desadaptativos, que estão em funcionamento em um indivíduo em dado momento” (Young, et. al, 2008, p.263).
A Técnica da Sala de Controle busca instrumentalizar o paciente na identificação desses modos, favorecendo o distanciamento crítico e a ativação do Modo Adulto Saudável. O conceito dialoga com os fundamentos da TCC clássica, conforme delineado por Beck (1979), na medida em que promove a identificação de pensamentos automáticos e sua relação com respostas emocionais e comportamentais. A metáfora da sala de controle contribui para a visualização ativa e manejo dos modos, ampliando o insight e facilitando intervenções cognitivas e comportamentais.
3. Objetivos da Técnica
- Promover o reconhecimento dos diferentes modos esquemáticos ativados;
- Favorecer o desenvolvimento do Adulto Saudável como mediador interno;
- Reduzir a impulsividade comportamental e reatividade emocional;
- Aumentar o tempo de resposta consciente em situações desafiadoras;
- Estimular a autorreflexão e a autocompaixão através do diálogo interno estruturado.
4. Estrutura do Protocolo
A Técnica da Sala de Controle é dividida em três fases progressivas, podendo ser utilizada em contexto terapêutico individual, em sessões presenciais ou como tarefa de casa orientada.
Fase 1: Identificação dos Personagens Internos (Modos Esquemáticos)
Procedimento: O paciente é convidado a imaginar uma sala de controle em sua mente, equipada com painéis, botões e telas. Dentro dessa sala existem personagens que representam diferentes modos esquemáticos, divididos em quatro categorias:
- Modos de Criança: Criança Vulnerável, Criança Raivosa, Criança Impulsiva/Indisciplinada, Criança Alegre;
- Modos de Enfrentamento Disfuncionais: Hipercompensador, Evitador (Protetor Desligado), Resignador (Capitulador Complacente);
- Modos de Pais Críticos: Crítico/Exigente, Punitivo;
- Modo Saudável: Adulto Saudável.
O terapeuta pode solicitar que o paciente descreva características visuais, voz, postura e comportamentos de cada personagem para reforçar a ancoragem imaginativa.

Fase 2: Reconhecendo o Ciclo Emoção-Comportamento
Procedimento: O paciente é orientado a observar, através da visualização, como diferentes personagens assumem o controle diante de situações emocionais. A metáfora da biblioteca emocional é utilizada para explicar como as emoções ativam modos específicos, que por sua vez selecionam comportamentos automáticos.
Técnicas sugeridas:
- Relatos situacionais na sessão para mapear personagens ativados;
- Escrita terapêutica com descrição de momentos e modos ativados;
- Diálogos simulados com modos específicos.

Fase 3: Retomando o Comando com o Adulto Saudável
Procedimento: O paciente aprende a introduzir, imaginativamente, o Modo Adulto Saudável na sala de controle. A prática consiste em ouvir todos os modos, validar as emoções presentes e decidir conscientemente a resposta mais adaptativa. O Adulto Saudável não exclui os demais, mas conduz o processo decisório.
Exemplo de diálogo interno sugerido:
- Criança Vulnerável: “Estou com medo, estou me sentindo sozinha.”
- Criança Raivosa: “Isso é injusto! Precisamos reagir!”
- Adulto Saudável: “Eu compreendo vocês e entendo porque estão assim. Sei que nosso medo é compreensível, mas podemos agir com calma. Vamos buscar uma solução que nos proteja e não gere arrependimento.”
Técnicas auxiliares:
- Gravações de áudio para reforço do diálogo interno;
- Repetição do exercício em situações de crise emocional;
- Role play em sessão para fortalecimento da mediação pelo Adulto Saudável.

5. Considerações Éticas e Terapêuticas
Este protocolo deve ser utilizado com pacientes aptos a práticas de visualização imaginativa, preferencialmente após adequada psicoeducação sobre modos esquemáticos. Em casos de pacientes com dissociação grave ou dificuldades com imagética, a técnica deve ser adaptada. O exercício não tem a intenção de suprimir as vozes modais ou emoções, mas de promover regulação e integração afetiva.
6. Conclusão
A Técnica da Sala de Controle se mostra uma ferramenta prática e simbólica para o fortalecimento do Adulto Saudável e regulação dos modos esquemáticos. Sua aplicação regular favorece maior consciência emocional, reduz reatividade impulsiva e estimula respostas mais adaptativas e conscientes frente aos desafios da vida cotidiana.
Referências:
- Beck, A. T. (1979). Cognitive Therapy and the Emotional Disorders. New York: Penguin.
- Young, J. E., Klosko, J. S., & Weishaar, M. E. (2008). Terapia do Esquema: guia de técnicas cognitivo-comportamentais inovadoras. Porto Alegre: Artmed.