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O desenvolvimento da autoestima e fortalecimento do self utilizando a Técnica do Espelho.

1. Introdução
A autoestima desempenha papel central no funcionamento psicológico do indivíduo, afetando diretamente suas relações interpessoais, autoconceito, sexualidade e autorrealização. Este protocolo se baseia nos pressupostos da Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC), com especial ênfase na Teoria dos Esquemas de Jeffrey Young, e incorpora compreensões da sexologia contemporânea acerca da relação entre corpo, prazer e identidade. A “Técnica do Espelho” é uma intervenção terapêutica estruturada em três fases, que visa promover reconexão com o self, aceitação da imagem corporal e autonomia no prazer, fortalecendo a autoestima por meio de uma integração afetiva e sensório-emocional com a própria identidade corporal.

2. Fundamentação Teórica

A técnica parte da compreensão de que o sujeito contemporâneo frequentemente constrói seu self a partir da imagem social projetada, perdendo a conexão com sua experiência autêntica. A Terapia do Esquema, desenvolvida por Jeffrey Young, aponta que crenças centrais como as que compõem os esquemas de defectividade/vergonha e fracasso têm raízes na infância e adolescência, moldando padrões de desvalorização e autocrítica que afetam profundamente a autoestima e a relação com o próprio corpo (Young, Klosko & Weishaar, 2008).

Tais esquemas podem ser intensificados por experiências de rejeição, bullying, abuso ou críticas parentais excessivas, formando narrativas internalizadas de que o corpo é indigno de amor, aceitação ou prazer. Nesse contexto, a imagem refletida no espelho se torna símbolo de estranhamento, julgamento e sofrimento. A técnica propõe resgatar, por meio da exposição controlada, o reconhecimento do corpo como extensão legítima da identidade e veículo de expressão afetiva e erótica.

Paralelamente, os estágios do desenvolvimento psicossocial e psicossexual descritos por Freud e reformulados por Erikson e a sexologia moderna, sustentam a importância das fases de autoexploração, erotização e diferenciação corporal na constituição de um self integrado. A falha ou repressão dessas etapas pode gerar bloqueios no reconhecimento do próprio desejo. Wilhelm Reich, em sua obra “A Função do Orgasmo” (Reich, 1973), ressalta a importância da livre expressão da sexualidade e da integração orgástica como fator de equilíbrio psíquico. Para ele, a repressão do prazer corporal está na raiz das neuroses modernas, e a reconexão com a energia vital do corpo representa um caminho terapêutico eficaz para a cura emocional.

Dessa forma, a Técnica do Espelho promove, em três momentos distintos, uma vivência progressiva de ressignificação do corpo: primeiro como entidade com a qual se estabelece contato afetivo (conexão), depois como território legítimo (aceitação) e, por fim, como fonte autônoma de prazer (desejo). A autoestima emerge, então, não como resultado de validação externa, mas como expressão interna de pertencimento ao próprio corpo e história.

3. Objetivos da Técnica

  • Desenvolver conexão autêntica com a própria imagem.
  • Favorecer aceitação corporal integral.
  • Fortalecer a autonomia do desejo.
  • Reduzir dependências de validação externa.
  • Promover autoestima funcional e afetivamente estável.

4. Estrutura do Protocolo

O protocolo é composto por três fases progressivas:

Fase 1: Conexão com o Eu
Duração sugerida: 1 a 2 semanas

Procedimento:
O paciente deve posicionar-se diante de um espelho de corpo inteiro, em ambiente silencioso e reservado. Durante 10 a 15 minutos diários, deve manter o olhar fixo em sua imagem refletida, focando inicialmente na região dos olhos. O objetivo é ultrapassar a experiência meramente visual e iniciar um diálogo interno com o self. Ao longo dos dias, espera-se que o paciente deixe de enxergar o “reflexo” e comece a reconhecer a “pessoa” que ali está.

Recursos terapêuticos sugeridos:

  • Registro de experiências e sensações após cada sessão.
  • Discussão em sessão sobre resistências, emoções emergentes e esquemas ativados.

Fase 2: Aceitação do Eu
Duração sugerida: 2 semanas

Procedimento:
O paciente é orientado a realizar os mesmos 10 a 15 minutos de observação no espelho, agora em condição de nudez. A intenção é promover a exposição gradativa da imagem corporal real, trabalhando com a desconstrução de padrões estéticos irreais e esquemas de vergonha corporal. Não se trata de erotizar o corpo neste momento, mas de aceitá-lo em sua existência concreta.

Técnicas complementares sugeridas:

  • Reestruturação cognitiva de pensamentos automáticos negativos.
  • Escrita terapêutica de cartas de aceitação ao próprio corpo.

Fase 3: Desejo do Eu
Duração sugerida: 1 a 2 semanas (ou conforme avaliação clínica)

Procedimento:
Com base em consentimento e avaliação de prontidão psicológica, o paciente é orientado a realizar um exercício masturbatório diante do espelho, com foco exclusivo em si. A intenção é promover o reconhecimento do desejo como algo que pode partir de si para si, sem mediação externa. Esse ato simbólico consolida a triangularidade proposta: conexão, aceitação e desejo pelo Eu.

Intervenções clínicas importantes:

  • Avaliação de histórico de trauma e limites pessoais.
  • Trabalho com permissividade erótica e autocuidado.
  • Discussão sobre erotismo responsável e fortalecimento do self erótico.

5. Considerações Éticas e Terapêuticas
Este protocolo deve ser aplicado apenas por profissionais devidamente formados, com experiência em terapia sexual e em TCC, e deve respeitar os limites subjetivos do paciente. A terceira fase deve ser opcional e cuidadosamente avaliada, especialmente em pacientes com histórico de abuso ou vergonha corporal intensa. Todo o processo deve ser conduzido dentro dos princípios de sigilo, consentimento informado, acolhimento e autonomia.

6. Conclusão A Técnica do Espelho se mostra uma possibilidade terapêutica potente para o desenvolvimento da autoestima e fortalecimento do self, ao promover uma vivência concreta de integração entre imagem, afeto e desejo. Seu caráter simbólico, aliado à estrutura da TCC e aos saberes da sexologia, permite ao sujeito reaprender a si mesmo com autonomia, ternura e pertencimento.

Referências:

  • Reich, W. (1973). A função do orgasmo. São Paulo: Expressão e Cultura.
  • Young, J. E., Klosko, J. S., & Weishaar, M. E. (2008). Terapia do esquema: guia de técnicas cognitivo-comportamentais inovadoras. Porto Alegre: Artmed.
  • Erikson, E. H. (1998). Infância e sociedade. Rio de Janeiro: Zahar.
  • Freud, S. (1905/1996). Três ensaios sobre a teoria da sexualidade. In: Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud, Vol. VII. Rio de Janeiro: Imago.